A humanidade está envelhecendo. Hoje, há mais de 1 bilhão de idosos no mundo, e a previsão é de que, até 2050, o planeta tenha mais de 2 bilhões de pessoas com mais de 60 anos. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que cerca de 30 milhões de brasileiros já atingiram essa faixa de idade. Para 2050, a previsão é de que o país tenha mais de 66 milhões de idosos.
O envelhecimento da população gera desafios para a saúde pública, uma vez que afeta a população de maneiras distintas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 14% dos idosos têm algum diagnóstico de doença mental. Para entender a relação entre o risco de morte e os antipsicóticos atípicos nas pessoas adultas e idosas com esquizofrenia, o médico geriatra e psiquiatra Júlio César Menezes Vieira se debruçou sobre o assunto durante seu doutorado no Programa de Pós-graduação em Medicamentos e Assistência Farmacêutica da Faculdade de Farmácia da UFMG.
Uma pesquisa, que culminou na tese Efetividade da clozapina nas diferentes fases da vida: análise de sobrevida de adultos idosos com esquizofrenia assistidos pelo Sistema Único de Saúde em um corte de 16 anos, mostrou que a clozapina oferece menor risco de morte no tratamento de pacientes refratários foram comparados a outros antipsicóticos atípicos distribuídos pelo SUS, como a risperidona, a olanzapina, quetiapina e ziprasidona. A descoberta feita pelo pesquisador é crucial para a prática clínica, especialmente quando se considera o envelhecimento das pessoas com esquizofrenia.
A clozapina
O tratamento da esquizofrenia é feito por meio de antipsicóticos. Há dois grupos de medicamentos usados ??contra a doença: os típicos, ou de primeira geração, e os atípicos, também conhecidos como de segunda geração. Os de primeira geração estão na atenção primária do SUS, porém apresentam maior risco de sintomas colaterais disponíveis. Os de segunda geração, por sua vez, tendem a causar menos efeitos colaterais motores e são mais caros. Mas eles também estão disponíveis pelo SUS, no Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (Ceaf), que é o departamento de alto custo do sistema.
A clozapina é um antipsicótico de segunda geração e indicação primeira na esquizofrenia refratária, ou seja, aquela que acomete os pacientes que não responderam bem a outros antipsicóticos previamente prescritos. Os principais efeitos da clozapina são sedação excessiva, hipotensão ortostática – queda excessiva da pressão arterial –, constipação intestinal e síndrome metabólica. A agranulocitose é o efeito colateral mais temido e ocorre quando os neutrófilos – células de defesa do sangue – caem de forma drástica. Entretanto, o acompanhamento e a monitorização hematológica em todos os pacientes em uso de clozapina diminuem esse risco.
Assim, é obrigatório acompanhamento hematológico rígido de quem utiliza o medicamento, incluindo hemogramas e visitas regulares ao médico, o que torna o tratamento mais difícil e caro para o sistema de saúde.
Diminuição do risco de morte
Em sua análise, Vieira reuniu dados do período de 2000 a 2016 agregados em bancos de dados dos sistemas ambulatoriais, hospitalares e de mortalidade do SUS. Inicialmente, o pesquisador analisou adultos com o diagnóstico de esquizofrenia acima de 18 anos, contabilizando 350 mil pessoas gastas no país. Em seguida, o pesquisador examinou 83 mil pessoas idosas com esquizofrenia que recebem pelo SUS os antipsicóticos atípicos.
“Para avaliar a efetividade da clozapina, usei os estágios de desenvolvimento dependentes, que é a mortalidade. Eu quis entender se havia, ao longo dos 16 anos, alguma diferença entre a mortalidade em pessoas que usam clozapina e que usam outros medicamentos. A nossa análise dos bancos de dados mostrou que houve, sim, diferença: quem usou clozapina teve menos risco de morte na comparação com quem usou outros antipsicóticos, tanto nos adultos mais jovens quanto nos idosos”, explica Júlio César Vieira.
Uma pesquisa levou em conta quantos pacientes com esquizofrenia sobreviveram durante 16 anos. O estudo constatou que os idosos com esquizofrenia que fizeram uso de antipsicóticos atípicos diferentes da clozapina apresentaram um risco de morte 54% maior na comparação com aqueles que receberam o medicamento. Nos pacientes adultos não idosos, o risco de morte foi de 21%.
“Uma vez que 30% dos pacientes com esquizofrenia são refratários, o estudo incentiva os médicos a prescrever a clozapina como uma boa alternativa para esses pacientes – ela é mais eficaz nesses casos. No nosso estudo, apenas 4,5% dos adultos com esquizofrenia receberam a clozapina. No caso dos idosos, o uso foi de 2,5% em pacientes de 60 a 69 anos, de 1,2% entre pacientes de 70 a 79 anos e de apenas 0,4% para pacientes acima dos 80 anos”, diz o pesquisador .